quinta-feira, outubro 15, 2009

PROTESTO DOS ALUNOS DO CURSO DE DIREITO DA UFF CONTRA A MORDAÇA QUE LHES ESTAVA SENDO IMPOSTA:

“A universidade, aliás, é, talvez, a única instituição que pode sobreviver apenas se aceitar críticas, de dentro dela própria, de uma ou outra forma. Se a universidade pede aos seus participantes que calem, ela está se condenando ao silêncio, isto é à morte, pois seu destino é falar.”
Milton Santos
O intelectual e a universidade estagnada
pronunciamento para a posse de professor emérito da USP


“’- Vejo duas cidades: uma do rato, uma da andorinha.’
O oráculo foi interpretado da seguinte maneira: atualmente Marósia é uma cidade em que todos correm em galerias de chumbo, como bandos de ratos que comem restos caídos dos dentes de ratos mais ameaçadores; mas está para começar um novo século em que todos os habitantes de Marósia voarão como andorinhas no céu do verão, chamando uns aos outros como se fosse um jogo, exibindo-se em volteios com as asas firmes, removendo do ar mosquitos e pernilongos.
‘ - É hora de concluir o século dos ratos e iniciar o das andorinhas - disseram os mais resolutos. E, de fato, sob o sinistro e sórdido predomínio ratinheiro, já se sentia incubar, entre as pessoas menos notórias, um ímpeto de andorinhas, que avançam no ar transparente com um ágil movimento de cauda e desenham com a lateral das asas a curva do horizonte que se alarga’.
Retornei a Marósia anos depois, considerava-se que a profecia da sibila havia tempos se tornara realidade; o velho século está enterrado, o novo está em seu ápice. A cidade certamente mudou, talvez para melhor. Mas as asas que vi são as de guarda-chuvas desconfiados sob os quais pesadas pálpebras se abaixam se olhadas; existem pessoas que acreditam poder voar, mas já fazem muito se levantam do solo abanando balandraus de morcego.”
Italo Calvino
As cidades invisíveis
Companhia das Letras 2008

“...
Posso, sem armas, revoltar-me’?
Olhos sujos no relógio da torre:
Não, o tempo não chegou de completa justiça.
O tempo é ainda de fezes, maus poemas, alucinações e espera.
O tempo pobre, o poeta pobre
fundem-se no mesmo impasse.
Em vão me tento explicar, os muros são surdos.
Sob a pele das palavras há cifras e códigos.
O sol consola os doentes e não os renova.
As coisas. Que tristes são as coisas, consideradas sem ênfase.
...
Uma flor nasceu na rua!
Passem de longe, bondes, ônibus, rio de aço do tráfego.
Uma flor ainda desbotada
ilude a polícia, rompe o asfalto.
Façam completo silêncio, paralisem os negócios,
garanto que uma flor nasceu.
...
É feia. Mas é realmente uma flor.
...
É feia. Mas é uma flor. Furou o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.”
Carlos Drummond de Andrade
A flor e a náusea
in A rosa do povo
Editora Record 2007


“Todos estão loucos, neste mundo? Porque a cabeça da gente é uma só, e as coisas que há e que estão para haver são demais de muitas, muito maiores diferentes, e a gente tem de necessitar de aumentar a cabeça, para o total .”
João Guimarães Rosa
Grande Sertão: Veredas
Nova Fronteira, 2005


E você
restringe ou expande
sua cabeça?
Re
pense a universidade


“Tristeza das gerações sem ‘mestres’. Nossos mestres não são apenas os professores públicos, apesar de termos muita necessidade de professores. No momento em que alcançamos a idade adulta, nossos mestres são aqueles que nos impressionam com uma nova radicalidade.”
Gilles Deleuze
Ele foi meu mestre
in Sarte, As moscas
Nova Fronteira, 2005


“Ninguém
Ninguém vai me acorrentar
Enquanto eu puder cantar
Enquanto eu puder sorrir
Enquanto eu puder cantar
Alguém vai ter que me ouvir
Enquanto eu puder cantar
Enquanto eu puder seguir
Enquanto eu puder cantar
Enquanto eu puder sorrir
Enquanto eu puder cantar
Enquanto eu puder...”
Chico Buarque
Cordão
1971

E você
canta, segue,sorri
ou se deixa acorrentar?
Re
pense a universidade


“Que mesmo no tempo mais sombrio temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode bem provir, menos das teorias e conceitos, e mais da luz incerta, bruxuleante e frequentemente fraca que alguns homens e mulheres, nas suas vidas e obras, farão brilhar em quase todas as circunstâncias e irradiarão pelo tempo em que lhes foi dado na Terra - essa convicção constitui o pano de fundo implícito contra o qual se delinearam esses perfis. Olhos tão habituados às sombras, como os nossos, dificilmente conseguirão dizer se sua luz era a luz de uma vela ou a de um sol resplandecente. Mas tal avaliação objetiva me parece uma questão de importância secundária que pode ser seguramente legada à posteridade.”
Hannah Arendt
Homens em tempos sombrios
Cia de Bolso, 2008


“O coro: Os ventos pararam e o céu está vazio! Vamos nos calar por muito tempo. Mas, ainda uma última vez, antes que nossas bocas sejam amordaçadas pelo terror: vamos gritar pelo deserto!
A peste: Eu reino, é um fato, logo um direito. No entanto, um direito que não se discute: vocês têm de se adaptar.
...
Abomino a diferença e a falta de razão.
...
Em resumo: trago o silêncio, a ordem, e a justiça absoluta. Não espero agradecimentos, o que faço por vocês é natural. Mas exijo a colaboração ativa. Meu ministério começou.”
Albert Camus
Estado de sítio
Civilização brasileira, 2002

E você
grita ou agradece?
Re
pense a universidade


“Coro: O outro corre! Tem medo e confessa. Está fora de si, enlouquecido. Tornamo-nos obedientes. Eles nos administram. Mas, no silêncio dos escritórios, escutamos um longo grito contido, aquele dos corações separados, falando do mar ao sol do meio-dia, do cheiro do carnaval à noite, dos braços frescos de nossas mulheres. Nossos rostos estão lacrados, nosso passos contados, nossas horas regulamentadas, mas nosso coração recusa o silêncio. Recusa as listas e matrículas, os muros intermináveis, as grades nas janelas, as manhãs cercadas de fuzis. (...) Que o vento sopre e possamos finalmente respirar.
A peste: Marquem-no! Marquem a todos! Mesmo que não digam nada, ainda se pode ouvir! Eles não podem protestar, mas seu silêncio range! Esmaguem suas bocas! Amordacem-nos e lhes ensinem as palavras de ordem, até que repitam sempre a mesma coisa para que se tornem os bons cidadãos de que precisamos.”
Albert Camus
Estado de sítio
Civilização brasileira, 2002

E você
repete ou range?
Re
pense a universidade


“Nada: A norma aqui é agir de modo que ninguém se entenda, mesmo falando a mesma língua. E, posso lhe garantir, estamos nos aproximando do instante perfeito, em que todo mundo falará e nunca encontrará eco. E onde quer que duas linguagens se encontrem nesta cidade, elas se destruirão tão completamente que tudo se encaminhará para o último desfecho - o silêncio e a morte.”
Albert Camus
Estado de sítio
Civilização brasileira, 2002

E você
e
ncontra eco
ou silencia o próximo?
Re
pense a universidade

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