segunda-feira, janeiro 22, 2018

85 minutos e 4 segundos


Oitenta e cinco minutos e quatro segundos. Foi esse o tempo de duração da nossa mais recente conversa ao telefone. Tive a curiosidade de vê-lo registrado no celular. Afinal, eram tantos os assuntos em pauta... O que mais me chamou a atenção foi a sua relação com elas, as palavras. Não imaginava encontrar eco em você, não com essa amplitude, embora soubesse que a leitura faz parte do nosso território comum, dentre tantos temas que nos aproximam. A palavra eco mexeu comigo. Gostei e descobri via Google que “um eco verdadeiro é uma única reflexão da fonte de som”.

Desliguei. Fui dormir. Era madrugada e estava cansada. Não consegui. Elas não saíam do meu pensamento. As minhas, as suas. Estavam com as mãos enlaçadas. Abraçaram-se em perfeita sintaxe, formaram orações subordinadas aos sentimentos, ao tempo. Nosso texto foi ficando coeso, rico em verbos no futuro do presente e alguns no pretérito, ainda imperfeito, mas indicativo...

Fazia frio. Cobri meu corpo com os termos de cada oração, tentando adormecer em paz. Antes, porém, precisava desdobrá-los, desvendar-lhes os sentidos, para me sentir totalmente aquecida. Foi quando descobri estar entre verbetes Houaissianos e neologismos vindos diretamente das Veredas dos seus Grandes Sertões. É, não há tradução possível. Rosa só tem sentido em nossa língua, assim como a saudade.

Então, perdida ao buscar coerência e me tornar inteligível – sei que não sou –, evitei a voz passiva que ainda soava em meus ouvidos. Procurei a ordem direta, cortei adjetivos e percebi o que me incomodava: advérbios de lugar. Continentes diferentes. Estávamos, fisicamente, bem distantes.

Vieram em meu socorro os advérbios de intensidade e modo. Vi que sentia muito a sua falta e de forma doída. Ah, as afinidades, os elos, os conectivos. Como fazem falta! Verdadeiros elãs da vida. Não houve emplastro ou bálsamo que pudesse colocar um ponto final nesse período, nesse inverno. Optei por esperar a chegada da primavera. Sei que quando entrar setembro as noites ficarão mais quentes.

Hora da revisão do que foi dito. Há boas elipses, mas ambiguidade e redundância também. Não vou cortá-las, pois sempre fizeram parte do nosso discurso. Ah, bem observado: não existem clichês entre nós e a semântica continua tudo de bom, com implícitos e explícitos à vontade, na fala de cada um, com todos os significantes e significados possíveis.

Qual o seria o gênero adequado para a escrita? Crônica ou e-mail? Ambos. Quanta metalinguagem!Quem sabe consigo fazer diferente ao transcrever a próxima ligação que houver entre nós.

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