adj. s.m. FARM 1 que ou o que combate os efeitos de uma toxina ou veneno (diz-se de substância, medicamento, soro). s.m. 2 p.ext. o que evita ou corrige (vício, defeito, estado de depressão psicológica, paixão etc.); corretivo, remédio. ETIM lat. antidôtum,i'id.', do gr. antidoton, ou 'id'. Dicionário Houaiss
quarta-feira, dezembro 09, 2009
ESTIVE EM LISBOA E LEMBREI DE VOCÊ
Jornal do Commercio (PE) / Data: 16/11/2009
Lisboa é álibi de vertiginoso amor expresso
Luiz Ruffato foi buscar sua matéria-prima nos proletários e imigrantes, na luz, cheiros e ruídos da capital portuguesa
Schneider Carpeggiani
O mineiro Luiz Ruffato é guiado por um projeto firme: escrever a grande narrativa da história proletária brasileira. Mas foi na forma de uma pequena narrativa (minúsculas 90 e poucas páginas) que o autor realizou sua melhor obra, Estive em Lisboa e lembrei de você. O livro condensa num ritmo vertiginoso todo o seu ideário social sob o disfarce de trapalhadas e de um álibi amoroso. Álibi esse, essencial. A novela faz parte da série Amores expressos, da Companhia das Letras, em que todos os escritores envolvidos precisam passar uma temporada de 30 dias no exterior com a garantia de uma trama amorosa na bagagem de volta.
“Quando fui convidado para participar do projeto, escolhi Lisboa por dois motivos. Primeiro, eu já conhecia bastante a cidade e seria mais fácil tentar compreendê-la. Segundo, eu sabia que queria contar a historia de um imigrante no exterior, que era um desdobramento natural das minhas preocupações como ficcionista. Eu só não tinha ideia ainda de como concretizá-la”, afirmou o autor, em entrevista para o JC.
Ruffato já vinha compondo a história da imigração em obras como Mamma, son tanto felice e O livro das impossibilidades, que começam com descendentes de italianos arruinados no interior de Minas, passando pela “fuga” para São Paulo e Rio de Janeiro em busca de utópicas oportunidades. Um pouco a história da sua família italiana e a de seus vizinhos em Cataguases – “O meu próximo passo como autor seria exatamente acompanhar a geração que trocou o Brasil pelo estrangeiro”.
“Em Lisboa, meus 30 dias foram de passear pela periferia da cidade, aquela habitada pelos trabalhadores e imigrantes e deixar me afetar por sua luz, seus cheiros, seus gostos, seus ruídos, enfim, me sentir como um imigrante em busca de realizar o sonho de possuir algo, coisa que no Brasil tornara-se impossível... Depois que voltei, ainda demorei muito para começar a trabalhar no livro... Deixei que tudo isso se assentasse e se tornasse literatura”, revelou.
“Sou um escritor de um tema só”
Para Luiz Ruffato, toda sua obra parte da mineira Cataguases e gira em torno do sentimento de personagens que estão sempre migrando
Estive em Lisboa e lembrei de você serviu para o escritor mineiro Luiz Ruffato colocar em perspectiva sua produção iniciada nos anos 1990: “Eu sou um escritor orgânico. (O romance) Eles eram muitos cavalos foi um livro experimental, onde busquei encontrar uma forma adequada para expressar minhas preocupações. Em Inferno provisório busquei discutir a história do Brasil dos últimos 50 anos, a partir da visão da classe média baixa. A mesma reflexão estava presente em De mim já nem se lembra e neste Estive em Lisboa e lembrei de você. Cataguases é sempre o ponto de partida e o universo representado é sempre o do proletariado. Eu não quero me afastar desse centro de forma alguma, e a minha preocupação, neste sentido, beira a obsessão. Sou um escritor de um tema só...”
O romance parte da confissão do narrador, um ex-viciado arrependido – “Voltei a fumar, após seis anos e meio, pouco mais ou menos, da minha visita ao doutor Fernando, quando ele, prescrevendo o tratamento – tegretol, fluoxetina e adesivos de nicotina –, alertou, ‘Os medicamentos auxiliam’, mas parar mesmo, de vez, condicionava à minha determinação, ‘Dura segundos a vontade... e passa’ – que procura algum tipo de recuperação (social, emocional ou algo que nem ele mesmo sabe bem o quê direito) num Portugal mitológico de tão distante”.
O narrador criado por Ruffato é uma espécie de arquétipo do sentimento de perda comum a todos imigrantes – “Eu sou imigrante... Meus avós maternos trocaram a miséria da Itália pela pobreza em Rodeiro, lá em Minas Gerais. E meus avos paternos trocaram a miséria de Portugal pela pobreza de Guidoval, Minas Gerais. Minha mãe e meu pai deixaram suas cidades por Cataguases, em busca de melhores perspectivas para os filhos, por meio da educação. E eu deixei Cataguases e fui morar em São Paulo. Portanto, ainda não paramos de imigrar. E o imigrante é o mesmo, seja aqui ou no exterior. Seus sentimentos, desejos e sonhos são os mesmos, ele só quer sobreviver e imaginar-se numa situação melhor daqui a algum tempo”.
Para a construção da trama, o autor travou contato com imigrantes mais como uma conversa entre iguais que como uma entrevista – “E não só com brasileiros, mas também africanos... Apenas conversamos, como conversam bons amigos, trocando confidencias e deixando falar o coração... Não acredito em literatura de tese ou em literatura de pesquisa... Muitas vezes, daí nascem bons relatos jornalísticos, boas teses de sociologia, mas poucas vezes boa literatura...”.
Mas onde está a trama romântica, que é o obrigatório álibi das Amores expressos, no meio de tanta história de imigrantes? “O amor é geralmente associado a relação passional entre um homem e uma mulher, ou entre dois homens ou duas mulheres, mas poucas vezes lembramos que há muitas maneiras de o amor se manifestar. Pode ser entre um ser humano e um animal, e pode ser também de um ser humano por sua cidade natal ou por outros seres humanos, naquilo que denominamos solidariedade. Desse ponto de vista, para cumprir meu contrato com o projeto Amores expressos, achei que podíamos ampliar o conceito de amor e entendê-lo no livro como micromanifestações de várias formas de amor...”.
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