Sinais do mar
de Ana Maria Machado
por FERNANDO PAIXÃO
Que beleza é Sinais do mar, de Ana Maria Machado. Obra de rara delicadeza editorial. Não apenas por conta do projeto gráfico de Luciana Facchini – reinventando ondas em azul-marinho a cada página do livro-objeto –, mas principalmente pelas poucas e primorosas palavras dessa autora de tão longa e bem sucedida carreira.
Bem se sabe que a arte da poesia é muito distinta da prosa. Pede uma cumplicidade entre o tema e os vocábulos que se aproxima da música. Mais que o reconto dos fatos, valoriza as imagens, os sons. E um silêncio sem palavras. Por isso, o escritor acostumado à prosa tem de reinventar os seus meios e modos, quando se põe a lidar com os versos. Deve desconfiar de si mesmo, se quiser de fato alcançar a dimensão poética.
Desafio esse que foi aceito (e vencido) por Ana. Basta dizer que esse livro ficou decantando ao longo de vinte anos, antes de chegar ao porto da publicação. Representou, na verdade, um longo processo de descobrimento poético por parte da autora, humilde para acolher a espontaneidade dos poemas e deixá-los na gaveta por muito tempo, sempre lidos e por vezes reescritos. Como ela não queria simplesmente escrever mais um livro, permaneceu exigente ao máximo. Queria, à sua maneira, flagrar alguma essência do mundo marinho.
E conseguiu. Seus poemas são como que barcarolas flutuando sobre uma vivência maior – tão maior – de águas e espaços: “Todo barulho/ é visão // O mar balança/ em lenta dança”. Para tanto, ela não oferece mais que palavras quietas e simples, mas carregadas de alta potência sugestiva. Não por acaso, começa com uma aquarela: “coral/ cores/ em coro”.
Digamos que muitos dos sinais reunidos dizem respeito a coisas e animais pequenos e tal, mas que repercutem a dramaticidade viva do imenso oceano. A magia deste conjunto está justamente em dizer em tom pequeno (sob a ótica universal de um vilarejo de praia) aquilo que não se permite nomear: o mar.
Resulta, assim, uma delicada sugestão de águas imaginárias para onde conflui de tudo: conchas e velas, proas e raios, peixes e luas, imensidões e infinitos.
Enquanto isso: “voam as gaivotas/ em revoadas vogais”.
FERNANDO PAIXÃO É POETA, AUTOR DE FOGO DOS RIOS (BRASILIENSE, 1989), 25 AZULEJOS (ILUMINURAS, 1994) E POESIA A GENTE INVENTA (ÁTICA, 1995), ESTE PARA CRIANÇAS. TAMBÉM ORGANIZOU UMA EDIÇÃO DA POÉTICA DE MÁRIO DE SÁ-CARNEIRO (ILUMINURAS, 1995)
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